imagem por: Ane Karoline

   Hoje, enquanto lia Clarice Lispector discorrer, majestosamente, sobre o amor, me lembrei de você. Eu quis te mostrar o trecho do livro e pude prever a sua resposta "essa Clarice Lispector é muito complicada, como você. Eu só li aquele conto 'O ovo e a galinha', sabe?...".
  Com essa minha mente, cheia de referenciais, que insiste em lembrar de tudo, eu poderia ter lembrado de qualquer pessoa, de qualquer coisa, mas me lembrei de você e das nossas conversas sem rumo durante as tardes quentes de setembro. Me lembrei disso porque as linhas que são escritas em nossas vidas sob a tinta do amor jamais são apagadas. Como eu tenho certeza disso? - você deve estar se perguntando. Eu tenho certeza disso porque, por diversas vezes, você me mostrou que não merece o meu amor e ele continua existindo. A gente sabe que ama alguém depois que, em algum momento, esse alguém não foi merecedor: amar só quando a gente merece é fácil, é um amor pago. Mas, deixe-me contar-lhe um segredo: o amor genuíno é gratuito e independente. Tão independente que independe, até, da reciprocidade para existir. É simples demais para fazer exigências, para querer algo em troca. O amor é anterior ao querer.
   Querer exige motivo e amar é isso mesmo: ter alguém em alta cota sem que se saiba o motivo. Nem sempre, o amor é tão fácil como caminhar de mãos dadas no parque e é, aí, que ele se faz. A gente sabe que ama alguém quando esbarra nos limites: nos nossos e nos do outro. A gente sabe que ama alguém quando esbarra com aquela parte do outro que é demasiadamente o outro para que possa ser entendida e, ainda assim, o amamos.
   Sei que sou demasiada e agudamente eu quando cito Clarice Lispector que escreve em metáforas e não em números -como você prefere. Sei que sou extrema e visceralmente eu quando escolho escrever nossos números por extenso e você, mesmo sem entender, mesmo sem concordar me pergunta sobre o que eu estou escrevendo e se dispõe a me ler. Então, o amor se faz, o amor se faz nesse exato momento. O amor se faz no exato momento em que não conseguimos entender o outro, não entendemos suas razões, vontades e ações e, então, a gente aceita. O amor aceita.
   Espero que aceite, então, meu amor partilhado: cada palavra é escrita com tinta de amor acariciando quem escreve e quem lê. É por isso que, aqui, me delongo em dizer: o amor que escrevo é sem querer, sequer, que me mande notícias, que me diga que leu- o que escrevo não é mais meu. Não fico esperando que me diga que fica -se for ficar, fica. Não escrevo esperando que me diga que sim ou que não: é sem pretensão. O amor não pretende: desprende. E isso é uma verdadeira dádiva quando a gente aprende.

  

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