Foto por: Ane Karoline (instagram)


Minha cabeça está sempre cheia, confesso. O coração, quase sempre, apertadinho que só. Uma confusão. Mas luto arduamente para não deixar que essa confusão transborde e agrida as outras pessoas como, geralmente me agride. Talvez por isso, sempre me surpreendo com a grosseria gratuita que vejo sendo espalhada por aí. E, foi assim que, mais uma vez, fui estapeada pela estupidez sem razão: manhã chuvosa de quarta-feira, na honrosa companhia de minha irmã caçula. 
Chegamos, as duas, sorridentes, de mãozinhas dadas, como sempre andamos. Encostamos na janela fria de uma das secretarias do labirinto bárbaro que é a Universidade de Brasília.  Interrompemos nossa conversação e eu fui chegando toda simpática:

-Bom dia!
(silêncio)
-Tudo bom? - aumentei o sorriso na intenção de aumentar a efetividade
-Bom dia. 
- Então, gostaríamos de buscar a carteirinha da minha irmã aqui. Você poderia nos ajudar?
- Identidade.
- Aqui! -ela abriu o sorriso imenso e ensolarado dela e entregou a identidade ao homem
-Tem que aguardar!
- Tudo bem! - sorrimos juntas e continuamos nossa conversa enquanto ele procurava a carteirinha.
Quando ele, vários minutos depois, atirou a carteirinha na mão dela, agradecemos e, antes de sairmos, me lembrei.
- Ah! Moço, moço, ia me esquecendo! (risadas) Você poderia, também, imprimir uma grade horária autenticada?
Ele me olhou com uma expressão que não consigo definir de outra forma que não seja nojo, antes de cuspir:
- É pra você ou pra ela?
- É pra ela. - respondi menos cheia de sorrisinhos
- Ela é muda ou doida?
- Desculpa, como assim?
- Carteirinha.
- Como assim? - repeti sem conseguir ignorar a agressividade dele.
- Ela é caloura, né? Calouro tem essa cara de que não sabe onde tá. Deixa ela se virar. -  ele disse com tanto desprezo que parecia que o tínhamos agredido. 
- Ela é minha irmã. Estou ajudando-a, já que não tem escrito protocolo em lugar nenhum de como se comportar. - meu coração começou a disparar quando olhei para  onde, alguns segundos antes, estava o sorriso da minha irmã e vi um rosto confuso.
- Carteirinha . - ele já estava sentando, digitando algo no computador.
Ela, que não era muda, nem doida, nem sonsa, nem perdida, entregou a carteirinha. Logo em seguida, pegou o papel e, olhando bem para ele, disse bem alto e claro: 
- Muito obrigada. Tenha um bom dia. 
Não consegui agradecer. 
Seguimos em silêncio. As duas tentando entender a razão de tamanha grosseria. Tentando entender a grosseria gratuita. Eu, que estou sempre muito abalada por tudo, resolvi tomar um gole d'água para engolir o nó que o tal secretário criou em minha garganta. Eu, que sempre causo tragédias, esbarrei em um rapaz. Garrafa d'água para um lado, tampa para o outro, minha dignidade para o outro. A camiseta verde ficou ensopada. Preparada para uma grosseria -  com razão - comecei a me desculpar repetidamente.
- Ei, ei, moça! Calma! Tudo bem. Daqui a pouco seca. Essa camiseta tá imunda, foi quase um favor. 
Respirei.
Ele, sorrindo, continuou.
- Olha, eu vou indo, tenho aula agora. Tenham um ótimo dia! 
Daquela camiseta verde imunda, recebi de volta a gentileza que havia dado alguns minutos antes. Não faço por retribuição, mas o ciclo da gentileza nunca me deixa na mão. 

Insisto incessantemente na gentileza e não é porque sou um ser humano iluminado e superior. Muito pelo contrário. Minha insistência na gentileza é, na verdade, a expressão do que sinto: não vejo graça nenhuma em magoar as pessoas. Além disso, ser gentil não me custa nada. Nadinha. Geralmente, para ser bem sincera, me acrescenta bastante. Ganho sorrisos belíssimos, escuto estórias, causos, contos e histórias. Ganho inspiração. 


Transformando desamor em poesia - em parceria com a melhor irmã do mundo - com o amor de sempre, 
Ane Karoline.

A gente segue sorrindo, né não? (instagram)



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