As mãos timidamente entrelaçadas, os rostos quase se tocavam, enquanto uma conversa qualquer fluía entre sussurros. Segunda-feira. Não se viam há quatro dias. Todo final de semana era a mesma angústia: ter que esperar quatro dias para matar um pouquinho da saudade, só para vê-la aumentar à medida que o afeto crescia. O tempo que tinham fisicamente juntos era oitenta e quatro vezes menor que o tempo que passavam afastados. Duas horas e meia por semana: metade na segunda, metade na quarta. E, no meio dos minutos contados, estava o inglês. Uma professora sempre pedindo atenção enquanto os dois pensavam em formas de, durante as atividades, estarem sempre próximos. Era bonito de ver, mas todo mundo fingia que não via que era para dar aquele ar de mistério que os amores incertos têm. 

Para mim, a situação era cativante de um jeito doloroso. Amores juvenis são encantadores e esse, o qual passei quarenta minutos dessa minha segunda-feira observando, me é especialmente fascinante: tem raiz no mesmo lugar onde o nosso amor teve. Não tinha como deixar passar, tive que observá-los - tão parecidos com o que acho que fomos. Deve ser por isso que os observei por quarenta minutos seguidos, na esperança de que não tivessem um fim como o nosso. Pronto, estava, mais uma vez, dada a sentença: lembrei de nós.

Lembrei que quase não conversávamos em inglês, apesar de sermos tão propícios a isso. Engraçado, né? Será que nossas conversas era tão cheias de conjugações a ponto de só serem possíveis em português? Não sei, não me lembro bem. Mas me lembro que adorava te contar minhas histórias e observar o jeito como você achava graça dos meus exageros e ficava procurando detalhes no que eu dizia para me mostrar que me dava a devida atenção. Foi assim que você me viciou em te contar histórias. De repente, queria te contar tudo. E queria ouvir tudo que você tivesse para me contar. Mesmo que fossem suas contas, que você sempre fazia. Você foi me seduzindo com essa neutralidade de quem cuida sem sufocar, com esse seu jeito de quem tem estabilidade suficiente para lidar com a minha loucura. Fiz de você lar. Sem que percebêssemos, você se tornou minha morada. Percebemos isso quando te vi chorar, lembra? Lembro que me assustei por perceber que, em uma de nossas conversas noturnas, você chorou por medo de me perder. Habitávamos um no outro.

Enquanto observava o casal de adolescentes apaixonados na aula de inglês dessa segunda-feira, tive a certeza que fui loucamente apaixonada por você - e por aquela música que até hoje ainda me dói escutar. Mas além disso, além da paixão, te amei. Te amei como achei que não fosse capaz de amar: sem esperar nada em troca. Não esperava mais que você me acompanhasse, me joguei de cabeça. Mesmo quando você engatou marcha ré e desmarcou vários de nossos compromissos - depois de ter me aprisionado a você - eu ainda aceitei ir ao cinema com você, assistir a um filme que eu não queria assistir. Mesmo depois de você ter desaparecido quando eu precisei de você, logo depois de eu ter te dado tudo que eu tinha em apoio, eu esperei - de braços abertos - que você aparecesse. Não esperei que você aparecesse para ficar, mas para - pelo menos -  me dizer as palavras que eu merecia escutar. Você optou pelo silêncio, não apareceu. Eu perdoei você. E me custou perdoar. Me doeu como se cacos de vidro rasgassem meu peito para sair. Vários caquinhos de pontas afiadas, todos os dias, me tirando o ar. Vários caquinhos me deixando em pedaços, sangrando, cada vez que te via seguir a vida como se não tivesse devastado a minha. Doeu um bocado. E em dias como hoje, quando lembro dos seus olhos semicerrados ao me olhar, ainda dói. Mas eu perdoei você.  Perdoei porque amei você. Amei você ao ponto de escrever tudo isso sabendo que você não vai me ler. E foi esse amor, que me viciou, depois quase me matou, que agora sossega para me deixar continuar. Amor que quase mata, empurra a gente para, além da sobrevivência: para a vida. 
com amor, 
Ane Karoline

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