Quem é fruto da periferia tem sempre a cabeça muito cheia. Não é uma escolha: a pessoa nasce e vai crescendo, vai crescendo, vai se fazendo gente e percebendo que a vida de quem nasceu ali é mais difícil que a vida de uns outros tantos. É correndo de bala perdida, ou carregando um fuzil no ombro que, ali por volta dos doze, treze anos, o filho da favela percebe que a vida é selvagem: matar ou morrer. É vendendo o almoço para comprar a janta e entregando panfleto de loja de calçado que a molecada aceita logo cedo o seu destino desgraçado. 

Os filhos da favela são muitos e estão por aí, aglomerados em qualquer ônibus velho; mesmo assim, não são representados: uma maioria esmagadora que vive sendo esmagada. Nem nos livros, nem nos filmes, nem nas telenovelas; ninguém parece querer retratar aqueles que mantém o país andando, ninguém parece achá-los dignos de representação - nem eles mesmos. QWN

Contrariando a maré, Geovani Martins escreve O Sol na Cabeça. O livro é um grito determinado a contar histórias de pessoas silenciadas através da re-humanização daqueles que são sempre marginalizados. Em seus contos, o autor traz à tona as condições de vida das pessoas que vivem nas periferias do Rio de Janeiro no Brasil, coloca sua escrita sobre a linha tênue que existe entre a realidade e a ficção abordando temas reais e atuais através de seus personagens fictícios - os quais, inclusive, representam muitas pessoas reais. 

Dentre os temas abordados no livro estão: o problema do tráfico de drogas nas comunidades, a criminalização de crianças, corrupção policial e intolerância religiosa. Martins coloca tudo de uma forma tão rasgada e natural que é um soco na boca do estômago do leitor ao se deparar com a realidade cruel tão nua - realidade essa que, sempre que possível, é posta de lado, é tida como normal. Citando o autor: "A gente se acostuma com cada bagulho sinistro, que pena é coisa que dá e passa".

De minha parte, só posso dizer que vejo o livro como um manifesto extremamente importante na literatura brasileira. Além disso, acrescento que é muito bem escrito e, sobretudo, que os contos são muito interessantes. Recomendo a leitura a todos e, em especial, a todos os brasileiros.

NOTA: 9,5/10

Ane Karoline


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